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No final da tarde de sexta-feira (09), dez minutos depois de ter protocolado o pedido de CPI para investigar as ações dos tribunais superiores do Poder Judiciário, conhecida como CPI Lava Toga, o senador Alessandro Vieira (PPS-SE) surpreendeu-se com a visita em seu gabinete de uma funcionária da assessoria legislativa do Supremo Tribunal Federal (STF). A servidora foi rápida e apenas lhe pediu a relação dos nomes dos 27 senadores que assinaram o requerimento em apoio à CPI. O senador, certo de que aquela era uma informação pública, entregou a lista. Na segunda-feira (11), três dos senadores – Tasso Jereissati (PSDB-CE), Kátia Abreu (DEM-TO) e Eduardo Gomes (MDB-TO) – retiraram as assinaturas. Sem o apoio mínimo necessário, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), arquivou o pedido. Para o senador, ficou claro que, de posse da lista, o STF começou a trabalhar para esvaziá-la. “Foi um movimento espantoso”, surpreende-se Alessandro Vieira, delegado de polícia em sua primeira experiência como parlamentar. “Para mim, foi uma ação política, que nada tem a ver com o que eu, pelo menos, esperava da ação institucional de um Poder na sua relação com outro Poder”, avalia o senador.
Alessandro Vieira foi, assim, apresentado, a uma prática que, infelizmente, vem se tornando comum e que provoca junto à opinião pública o imenso desgaste da Suprema Corte. Cada vez mais, o STF age politicamente. Interfere nas decisões dos demais Poderes. Surpreende com decisões que parecem ter viés partidário e não jurídico. Divide-se quase às vias de fato na defesa dos interesses dos seus aliados. A Casa que deveria proteger a Constituição e as Leis, dirimindo as dúvidas da sociedade, gera ainda maior insegurança jurídica. Acaba por provocar suspeitas sobre a sua atuação. E age nos bastidores para evitar que se investigue e se discuta o que ela faz.
A ação para evitar a CPI não foi à única dos últimos dias a revelar a disposição de um Poder que não deseja dar explicações à sociedade. No final da semana passada, Gilmar Mendes reagiu intensamente a informações de que a Receita Federal estaria fazendo uma investigação sobre suas movimentações financeiras. Nenhum detalhe sobre o que eventualmente a Receita poderia estar investigando foi revelado. Nem mesmo foi confirmado se de fato tal apuração ocorria. Mas Gilmar Mendes enviou um ofício exigindo do presidente do STF, José Antônio Dias Toffoli, que pedisse explicações formais ao ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a tal investigação. Se nada tem a ocultar, Gilmar Mendes não deveria demonstrar tamanha indignação. Como servidor público, Gilmar deve satisfações à sociedade dos seus atos. Ao final da confusão, a Receita Federal garantiu que não está investigando o ministro.
Relação estremecida
Reservadamente, os ministros do Supremo admitem saber que hoje a relação que a sociedade tem com eles é de desconfiança, bem diferente do que acontecia durante o julgamento do Mensalão, quando a prisão de poderosos rendeu à Corte seu melhor momento. Apesar da constatação, eles reagem no sentido de se protegerem de forma corporativa. Na quarta-feira 11, Toffoli fez um almoço com os demais ministros para reforçar uma imagem de que eles, que protagonizaram disputas renhidas e deseducadas muito recentemente, estão unidos. O presidente do Supremo quer criar um espírito de corpo entre seus pares, como forma de preservar a Corte.
Nesse sentido, ele tratou também de tentar aparar arestas com o governo Bolsonaro. Nos bastidores do tribunal, cresciam as impressões de que havia as digitais do governo na criação da CPI Lava Toga. Especialmente dos aliados do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Que teriam ficado indignados com outra manobra controversa do STF nos últimos dias, quando Toffoli inaugurou um indecoroso plantão da madrugada no Supremo, para decidir em pleno sábado 2 de fevereiro que a votação para a Presidência do Senado deveria ser secreta e não aberta. Esses argumentos o próprio Onyx levou para um encontro privado fora da agenda de ambos em um restaurante de Brasília na terça-feira 12. Os dois sentaram-se em uma parte reservada do restaurante e ali colocaram suas questões em pratos limpos. Saíram pregando a necessidade de união entre os Poderes, que mais tarde foi também endossada por Alcolumbre em nome do Legislativo.
Ainda há desconfortos. Por exemplo, com a articulação da deputada Bia Kicis (PSL-DF) para tentar revogar a chamada PEC da Bengala, que aumentou para 75 anos a idade de aposentadoria compulsória dos ministros do Supremo. Bia quer fazer voltar à idade anterior, de 70 anos. Caso consiga, o governo Bolsonaro passaria a ter a primazia de substituir da Corte quatro ministros que já têm ou chegarão a essa idade em seu mandato: Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Bia busca assinaturas para ingressar com o pedido de revogação da PEC. Como ela é conhecida como uma amiga pessoal do presidente, interlocutores dos ministros do STF enxergam na iniciativa a digital do próprio Bolsonaro.
O problema é que, no atual momento, mais que nos demais Poderes as razões de crise e instabilidade parecem partir das atitudes da própria Suprema Corte. Na quarta-feira 11, a pauta de julgamento do STF gerou novas reclamações de parlamentares da base do governo ligados à agenda de costumes. O STF pautou o julgamento de ações que questionavam se o Legislativo não teria sido omisso ao não criar legislações mais rígidas contra a homofobia e outras formas de preconceito. Diante da perspectiva de ver o STF avalizando tal omissão, a bancada ligada aos costumes reagiu dizendo que novamente o tribunal parecia querer assumir o papel de legislador. Como fizera, por exemplo, ao legalizar a união entre pessoas do mesmo sexo, diante também de omissão do Congresso.
Afeta igualmente a credibilidade hoje do STF as decisões de seus ministros ao sabor das suas convicções políticas pessoais e suas afinidades. No ano passado, virou motivo de chacota a dualidade entre a Primeira e a Segunda Turma da Corte: uma era rigorosa prendia e condenava todo mundo; a outra, ao contrário, soltava todos aqueles que lhe pedissem socorro. Uma ficou conhecida como “Câmara de Gás”, outra como “Jardim do Éden”.
Desta vez, ciosos da leitura da Constituição, os ministros do Supremo argumentam que não há um fato objetivo que justifique a criação de uma CPI para investigá-los. O problema é que, dado o comportamento corriqueiro dos 11 integrantes da Corte, ninguém hoje parece confiar muito no rigor das suas argumentações jurídicas. Haja ou não uma CPI, a sociedade tem o direito de saber: o que leva o Supremo a produzir hoje tanta confusão e insegurança jurídica?
(Por PE notícias)
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