Presos na Operação Turbulência são levados para o Cotel (Foto: Bruno Marinho/G1)
O Ministério Público Federal (MPF) em Pernambuco ofereceu denúncia contra 18 suspeitos de integrar a organização criminosa investigada pela Operação Turbulência, deflagrada no dia 22 de junho deste ano. A ação da Polícia Federal apurou um esquema que liga empresas de fachada à compra do avião Cesna Citation, usado pelo ex-governador Eduardo Campos (PSB) no dia do acidente em que ele e mais seis pessoas morreram, em agosto de 2014, em Santos (SP).
Denúncia foi enviada pela Procuradoria da República na segunda-feira (1º) pelo procurador Cláudio Henrique Cavalcanti Machado Dias. Todos foram denunciados por crimes contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro oriundo de superfaturamento em obras públicas e pagamento de propinas a agentes políticos e funcionários públicos. De acordo com o MPF, os acusados são divididos em categorias, conforme o papel desempenhado.
Entre os líderes estão João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, Eduardo Freire Bezerra Leite e Apolo Santana Vieira. Todos permanecem presos no Centro de Triagem de Abreu e Lima (Cotel), no Grande Recife.
Atuavam como gerentes do esquema, segundo o MPF, Arthur Roberto Rosal, também preso no Cotel, e Paulo Cesar Morato, que é apenas citado na denúncia e não integra o grupo dos 18 indiciados, já que foi achado morto em um motel de Olinda depois dias depois da deflagração da Operação Turbulência. Até agora, mais de um mês depois do óbito e de a polícia informar que ele morreu em decorrência de uso de veneno para matar ratos, ainda não se sabe se foi suicídio ou homicídio.
Eles foram indiciados pela Polícia Federal no dia 15 de julho. Nessa data foi concluído o relatório final do inquérito 163/2016. O caso está sendo analisando na 4ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco.
Os advogados Ademar Rigueira Neto, defensor de Apolo Santana Vieira, Maurício Leite, de João Carlos Lyra, e Ludmila Groch, de Eduardo Freire, informaram que só irão se pronunciar quando tiverem acesso formal à denúncia. O outro advogado de Lyra, Nabor Bulhões, está fora do país. A equipe de reportagem não conseguiu localizar o advogado de Arthur Roberto Rosal.
O MPF requereu ainda a instauração de novo inquérito policial para aprofundar as investigações a respeito dos crimes de lavagem de dinheiro e contra o sistema financeiro nacional praticados pela organização criminosa, uma vez que ainda estão pendentes algumas diligências investigatórias para o esclarecimento total a respeito desses crimes.
Eduardo Campos sai do jato modelo Cessna 560XL, prefixo PR-AFA, usado nas viagens para compromissos de campanha do candidato à Presidência. A foto é de 29 de maio de 2014 (Foto: Edson Silva /Folhapress/Arquivo)
Investigação
O caso teve início com as apurações sobre a propriedade da aeronave Cessna Citation PR-AFA, cuja queda provocou a morte do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, em 2014.
De acordo com as apurações, o grupo criminoso atuava desde 2010, mediante o controle de movimentações financeiras fraudulentas entre pessoas físicas e jurídicas, envolvendo empresas de fachada e caixa paralelo de empresas em atividade, de maneira eventual – por meio de empresas coligadas à organização – e continuada – no caso de empresas gerenciadas pelos membros da organização.
Os líderes direcionavam as transações bancárias ilícitas com auxílio dos gerentes, utilizando as contas bancárias dos colaboradores e operacionalizando a gestão e a circulação dos recursos ilícitos por meio dos subordinados. A ligação entre os líderes ficou evidente desde o início das investigações, pois os três tiveram participação no arrendamento da aeronave Cessna Citation PR-AFA.
Para o MPF, embora nem todos os denunciados soubessem do funcionamento total do esquema criminoso, todos tinham consciência e manifestaram vontade de participar da empreitada ilícita, assumindo os riscos pelo envolvimento na fraude. A pena para o crime de formação de organização criminosa pode chegar a oito anos de reclusão.
Corpo do empresário Paulo César Morato foi encontrado em motel, em Olinda (Foto: Bruno Marinho/G1)
O relatório
De acordo com o relatório da PF, a investigação foi deflagrada para identificar uma organização criminosa que usava contas de pessoas físicas e jurídicas, em sua maior parte empresas fantasmas ou de fachada constituídas em nome de laranjas, para fazer circular recursos de origem ilegal. O grupo, segundo a PF, ocultava os remetentes e os verdadeiros destinatários dos valores tramitados e os reais controladores das contas investigadas.
A organização criminosa, aponta o relatório, foi desbaratada a partir de investigação iniciada por meio de relatório de inteligência elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). O colegiado teria detectado movimentações suspeitas nas contas de duas empresas utilizadas para a aquisição da aeronave que servia à campanha de Eduardo Campos.
Nas investigações, ficou comprovada, conforme a PF, a relação entre essas empresas de fachada e a aquisição do avião. Ainda segundo o relatório, três dos empresários presos em Pernambuco – João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, Eduardo Freire Bezerra Leite e Apolo Santana Vieira – não apenas integravam como eram os principais expoentes da organização criminosa.
A análise das contas de pessoas físicas e jurídicas utilizadas nessas transações revela que a organização atua com o objetivo de dificultar o rastreamento dos recursos, bem como de ocultar o verdadeiro responsável pelas operações financeiras. Algumas dessas pessoas jurídicas foram criadas exclusivamente para receber os aportes financeiros ilegais; outras vezes, foram utilizadas contas bancárias de empresas já existentes visando encobrir o real sujeito da relação jurídica.
Ligações
Parte das movimentações financeiras detectadas pelo Coaf nas contas das pessoas físicas e jurídicas investigadas teria ocorrido de janeiro a setembro de 2014. Esse fato chamou a atenção da PF, em virtude da proximidade com o período pré-eleitoral. A Polícia Federal salienta, no entanto, que foram detectadas inúmeras transações financeiras suspeitas já no ano de 2010 e que continuaram sendo feitas.
A PF faz a ligação direta entre a compra do avião e os três ‘expoentes’ da organização: João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, Eduardo Freire Bezerra Leite e Apolo Santana Vieira. Paulo César de Barros Morato e Artur Roberto Lapa Rosal são apontados como ‘testas de ferro’.
Eles seriam as pessoas que mantinham um relacionamento próximo com os ‘cabeças’ da organização criminosa. Integrariam o quadro societário de empresas fantasmas ou emprestariam as próprias contas pessoais para recebimento e movimentação dos recursos, mas também cooptariam 13 outros ‘laranjas’.