Em um cenário de crescente frota de motocicletas, que saltou 42% entre 2015 e 2024, atingindo 35 milhões de veículos, o governo federal propõe uma mudança radical no processo de obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). A consulta pública, lançada com o objetivo de “tornar o documento mais acessível e barato”, visa um “novo modelo de formação de condutores” que dispensa as aulas práticas obrigatórias.
A proposta permite que candidatos se apresentem ao Detran sem comprovar as 20 horas-aula mínimas exigidas para as categorias A e B, incluindo a aula noturna. O Ministério dos Transportes argumenta que a medida visa regularizar a situação de aproximadamente 14 milhões de motociclistas que conduzem sem habilitação.
A iniciativa, no entanto, levanta questionamentos sobre a segurança no trânsito e o impacto na saúde pública. Especialistas alertam para o risco de aumento no “Custo Social do Acidente”, que em 2023 já atingiu R$80 bilhões, considerando gastos com saúde, previdência e perdas econômicas. Até maio deste ano, internações de motociclistas já somavam mais de R$2 bilhões, representando 55,2% dos gastos hospitalares com vítimas de trânsito.
Entidades do setor também manifestaram preocupação com a proposta. A Federação Nacional das Autoescolas (Feneauto) acusa o governo de romper o diálogo sobre a questão e prevê demissões em massa, estimando que 79.038 trabalhadores do setor podem perder seus empregos diretamente, com um impacto indireto em mais de 200 mil postos de trabalho. A Feneauto defende a formação de condutores como uma atividade regulamentada que assegura padrões mínimos de qualidade e contribui para a formalização do mercado de trabalho.
A proposta se inspira em modelos de formação de condutores de países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Japão e Uruguai. No entanto, críticos ressaltam que esses países possuem níveis de educação e segurança no trânsito superiores aos do Brasil.
Enquanto o governo aposta na adesão da população à nova medida, entidades de saúde temem o aumento da ocupação de leitos hospitalares por vítimas de acidentes de trânsito, uma realidade que já sobrecarrega o sistema de saúde. A medida vem na contramão de projetos como o CNH Social, sancionado recentemente, que busca custear a formação teórica e prática de direção veicular para pessoas de baixa renda, utilizando recursos arrecadados com multas de trânsito.