Nos meus últimos dias em Belém, durante a COP30, assisti a uma cena que não vou esquecer: Heloísa Schürmann, a matriarca da família, gravava um vídeo sobre as graves consequências das mudanças climáticas para os oceanos.
Quando ela terminou de falar, comentei em tom de admiração:
– Nada como uma pessoa media trained.
Ela me olhou e, com a elegância de quem conhece o mundo e o mar, me corrigiu:
– Media trained, não. Heart trained.
Ela tinha razão. Para alguém que passou décadas velejando ao redor do planeta, vivendo a intimidade radical que só o mar permite, a urgência climática deixa de ser uma equação técnica. É pessoal. É íntima. É do coração.
A crise dos plásticos nos oceanos – principal bandeira da família Schürmann através do Instituto Voice of the Oceans – torna-se mais grave a cada ano. E agora, sabemos, ela está ainda mais entrelaçada à crise climática.
Um estudo recém-publicado na Frontiers in Science, conduzido por pesquisadores do Imperial College London, revela que a poluição plástica, que já ameaça a saúde humana e os ecossistemas, está se tornando mais móvel e perigosa por causa dos eventos climáticos extremos.
Ondas de calor e enchentes cada vez mais intensas, por exemplo, aumentam a dispersão de resíduos plásticos e aceleram sua fragmentação. Com temperaturas mais altas e umidade, o plástico se degrada mais rápido, desfazendo-se em micro e nanoplásticos invisíveis – mas presentes em tudo.
O estudo traz outro alerta ainda mais inquietante: as mudanças climáticas não apenas multiplicam os microplásticos, como os tornam mais tóxicos, fazendo com que absorvam pesticidas e substâncias químicas que não se decompõem no ambiente. O calor facilita a absorção e a liberação desses contaminantes, intensificando o potencial de envenenamento dos ecossistemas.
As consequências para os oceanos são devastadoras. Recifes de coral, já fragilizados pelo aquecimento, sofrem ainda mais; animais marinhos ingerem microplásticos e os transferem para seus predadores, empurrando a contaminação para o topo da cadeia – até chegar em nós.
O estudo é categórico: precisamos de ações rápidas e efetivas para reduzir drasticamente a produção de plásticos. A ameaça é real, está crescendo, e a tendência é piorar: a produção global de plástico aumentou 200 vezes entre 1950 e 2023, e continua em ritmo acelerado.
Diante disso tudo, lembro da frase da Heloísa: heart trained. Talvez seja exatamente isso que nos falte – transformar técnica em empatia, dados em ação, ciência em urgência sentida no peito.

