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Do tumor à pessoa: o cuidado que o Brasil precisa enxergar

Durante a ESMO 2025, o maior congresso europeu de oncologia, um slide simples apresentado por uma paciente capturou o silêncio de uma plateia repleta de especialistas: “See the patient, not only the diagnosis or the tumour. Talk to the patient, not over the patient.” Poucas palavras. Mas um lembrete poderoso. No meio de tanta ciência e tecnologia, ainda é preciso reafirmar o óbvio: há uma pessoa por trás de cada diagnóstico.

Em uma das apresentações, numa sala sobre qualidade de vida com ou após o câncer, uma imagem simbólica resumiu o dilema moderno do cuidado: um paciente sentado diante de um grupo de médicos que discutem intensamente o tumor depositado sobre a mesa. O paciente está na sala mas não participa, não opina, não está no centro da conversa.

Essa metáfora me atravessou, porque representa o que ainda acontece com frequência, tanto na prática clínica quanto nas decisões e políticas de saúde: vemos e discutimos o tumor, mas esquecemos de ver e ouvir quem o carrega.

O olhar que o Brasil precisa cultivar

Esse é um debate que o Brasil precisa enfrentar com urgência. Nosso sistema ainda é profundamente hierárquico e paternalista: o médico fala e o paciente escuta. O gestor decide e o que importa para o paciente raramente é considerado. E, no meio disso, a experiência humana se perde junto com a chance de um cuidado mais seguro, mais efetivo e mais digno.

Não se trata de dar tudo para todos, mas de decidir com base em valor: decisões que considerem benefícios clínicos, sociais e humanos, não apenas econômicos. A evolução da oncologia no país precisa incluir algo que ainda não cabe nos protocolos: a escuta e o diálogo de qualidade.

Ver o paciente é reconhecer sua história, seus medos e suas prioridades. Falar com o paciente, e não sobre ele, é reconhecer que o conhecimento técnico precisa dialogar com o conhecimento vivido.

O novo paciente e o papel das organizações

Na ESMO, tive ao meu lado pacientes que convivem ou já conviveram com a doença, assistindo às mesmas sessões científicas que médicos, pesquisadores e gestores. Estão ali para aprender porque entendem que participar exige preparo e respeito.

Esse novo paciente sabe que ocupar espaço não é invadir: é colaborar e construir junto. Sabe que falar a mesma língua cria pontes e reduz distâncias. E sabe que, para ser respeitado, também é preciso respeitar, inclusive o tempo da ciência e os limites do cuidado.

E quando o paciente não pode estar presente, nós, as organizações de pacientes, estamos. Estamos para aprender, representar, provocar reflexões e garantir que o que importa para o paciente não se perca nas entrelinhas dos gráficos e dos dados. Nosso papel é também lembrar que, por trás de cada número, existe uma vida que espera, sofre, sonha e luta para continuar.

Técnica, sim. Mas ética, sempre.

O cuidado e as decisões em saúde precisam de técnica, sim, mas precisam, antes de tudo, de ética. Ver e incluir o paciente é mais do que empatia: é precisão ética. É lembrar que nenhuma inovação faz sentido se não melhorar a vida de quem está por trás do diagnóstico.

O cuidado centrado no paciente não é o futuro, é o que precisa ser feito agora. Precisamos mudar a forma como olhamos, decidimos e cuidamos hoje, dentro dos consultórios, hospitais e gabinetes. Porque enquanto discutimos sistemas e políticas há pessoas esperando por humanidade. E é por isso que seguimos — pacientes e organizações — lembrando, todos os dias, o que realmente importa: cuidar de quem vive, e não apenas tratar quem adoece.

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