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Com milhares de mortos e refugiados, guerra na Ucrânia completa um ano

Para os especialistas, a situação atual se deve, entre outros fatores, ao temor de avanço da Otan nos países próximos à fronteira com a Rússia, bem como ao receio de avanço de tropas russas em territórios de países vizinhos.

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Rússia e Ucrânia completam nesta sexta-feira (24) um ano de conflito. Milhares de vidas foram ceifadas, milhões de pessoas tiveram de deixar suas casas para tentar a vida em outros países e milhões de crianças abandonaram as escolas. Verdades e mentiras são espalhadas não apenas pela internet, mas também por fontes oficiais.

Para se ter uma ideia do desencontro de informações, o número de mortos varia, dependendo da fonte, de cerca de 7 mil, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a mais de 300 mil, de acordo com fontes militares consultadas por mídias europeias.

Em meio a todo esse cenário de dúvidas e incertezas, a Agência Brasil buscou com especialistas e intelectuais referências que possibilitem aos leitores entender o que está, de fato, por trás do conflito.

Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), Roberto Goulart Menezes explica que o embate vai muito além de duas nações, o que de certa forma lembra a antiga Guerra Fria, na qual os Estados Unidos (EUA) e a União Soviética se enfrentavam indiretamente, na busca por ampliar áreas de influência em diferentes regiões do planeta.

“Podemos denominar o conflito como uma guerra por procuração, após a Rússia ter violado a soberania territorial e o direito internacional, quando invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022”, diz o professor. Segundo ele, ao enfrentar a Ucrânia, a Rússia tem um embate “contra a Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte] e contra a principal liderança do grupo: os Estados Unidos, embora não estejam diretamente atuando no conflito”.

“O que está acontecendo, na realidade, não é guerra da Ucrânia. É guerra na Ucrânia. É uma guerra do Ocidente contra a Rússia”, afirma o diretor do Instituto de Politicas Públicas e Relações Internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), professor Hector Luis Saint-Pierre.

Para os especialistas, a situação atual se deve, entre outros fatores, ao temor de avanço da Otan nos países próximos à fronteira com a Rússia, bem como ao receio de avanço de tropas russas em territórios de países vizinhos.

“O ponto inicial foi de expansão da Otan em direção às fronteiras da Rússia. Durante o governo de George Bush, entre 2001 e 2009, os EUA vinham desenvolvendo, por meio da Otan, uma espécie de escudo espacial para tentar neutralizar boa parte dos armamentos da Rússia que pudessem ser utilizados contra países europeus”, afirma Menezes.

A hostilidade, lembra o professor, só cresceu nos últimos 20 anos. “A Rússia até chegou a ter uma parceria especial com a Otan”, mas a situação mudou, sobretudo a partir de 2014, quando invadiu e anexou a Crimeia.

Menezes lembra ainda que o argumento reiteradamente utilizado pelo presidente russo, Vladimir Putin, foi de que, com a expansão da Otan em direção aos países do antigo Leste Europeu, a Ucrânia estava prestes a se tornar membro permanente do grupo liderado pelos EUA.

“Só que a Rússia considera que a Ucrânia na Otan significa a Otan em fronteiras russas, o que inclui o temor de nuclearização do território ucraniano”, completou o professor da UnB.

Para ele, o fato é que a Rússia invadiu a Ucrânia e não esperava a reação do país e o apoio da opinião pública que está recebendo, além do apoio militar. Desde então, as relações entre Otan/EUA e Rússia tem degringolado cada vez mais”, acrescentou ao classificar a Rússia como “agressora”.

Na avaliação do diretor da Unesp, Saint-Pierre, um fator relevante para a situação atual foi o fato de a Ucrânia ter sofrido um golpe de Estado em 2014, após a destituição do presidente eleito Viktor Yanukovych, em meio aos violentos protestos da chamada “Revolução da Dignidade”, iniciada na capital Kiev.

O presidente deposto refugiou-se na Rússia, em meio à acusações de ser responsável pela morte de manifestantes. Foi então instalado um governo interino, com o apoio de grupos de direita. Nas eleições seguintes, em maio de 2014, foi eleito Petro Poroshenko, um político favorável à aproximação da Ucrânia com o Ocidente.

“O golpe de 2014 foi contra um governante eleito que não pretendia entrar na Otan. Por isso, foi golpeado e destituído. A partir daí, foi montada uma estrutura de avanço contra toda cultura russa, na Ucrânia e a na Crimeia, onde está boa parte da base naval russa”, argumentou.

Segundo Saint-Pierre, esse “golpe de Estado” teve o apoio financeiro dos Estados Unidos, “conforme declarado, inclusive, por parlamentares no próprio Congresso norte-americano”. O apoio financeiro acabou por “armar até grupos neofascistas, além de financiar laboratórios de guerra biológica”.

De acordo com Menezes, há, de fato, desde a independência da Ucrânia, a atuação de grupos neonazistas no país. “O Regimento Azov [milicia paramilitar] sempre foi controverso, pois foi fundado por ultranacionalistas e neonazistas ucranianos e atua na Região Leste do país. Mas isso é diferente de afirmar que toda a Ucrânia é fascista ou neonazista, como às vezes dizem os que tentam justificar a agressão”.

“O fato é que com sua independência, em 1991, a Ucrânia era o terceiro país no mundo em número de ogivas nucleares, com cerca de 1,9 mil dessas armas. Um acordo em 1994, envolvendo países europeus e os EUA, acabou resultando na transferência das ogivas à Rússia, com a concordância da própria Ucrânia, temendo um acidente nuclear ou mesmo a utilização ilegal desses armamentos por parte de grupos que não fossem do Estado ucraniano”, acrescentou Menezes.

O processo de negociação para a transferência das ogivas incluía garantias de que os limites fronteiriços seriam respeitados. Tratados foram assinados garantindo, de um lado, o respeito às fronteiras e, de outro, o não avanço da Otan nos países do Leste Europeu.

“Naquele momento, o que Putin exigia era plausível, que era o reconhecimento dos pactos tratados. No entanto, a própria Angela Merkel [então chanceler da Alemanha] reconheceu que nunca pensaram em cumprir os pactos, e que eles eram para dar tempo de a Ucrânia se armar e se preparar para criar uma resistência”, detalha Saint-Pierre.

O país então surpreendeu ao eleger presidente, em 2019, um outsider do mundo político: Volodimir Zelensky, um comediante que usava os próprios personagens durante a campanha eleitoral.

O então candidato adotou discursos antissistema, em uma campanha basicamente virtual, por meio de redes sociais. A liderança nas pesquisas de opinião e a eleição foram possíveis graças à rejeição da população a políticos tradicionais do país.

Tanto a Rússia quanto a Ucrânia reivindicavam a região da Crimeia, considerada estratégica pelo seu posicionamento geográfico. A disputa pelo território acentuou ainda mais a crise que já vinha crescendo entre os dois países.

“Os dois países faziam parte da União Soviética, que foi dissolvida em 1991. Antes disso, em 1956, o então presidente da União Soviética era ucraniano: Nikita Krushev, que, na época, cedeu o território da Crimeia para a Ucrânia”, explica Menezes.

Do ponto de vista russo, no entanto, a Crimeia teria muito mais vínculos históricos com a Rússia do que com a Ucrânia.

Em março de 2014, o Parlamento da Crimeia aprovou a entrada do país na Federação Russa – decisão que posteriormente foi aprovada pela população local, em referendo cujo resultado sofreu contestações devido a uma suposta “falta de monitoramento por terceiros”. Mesmo diante de questionamentos, a Crimeia oficializou pedido de adesão à Rússia.

Nesse contexto, o presidente deposto e exilado Yanukovych solicitou à Rússia que usasse forças militares para ajudar o povo ucraniano a “estabelecer a legitimidade, a paz, a lei e a ordem”. Putin, então, obteve, no Parlamento, autorização para assumir o controle da Crimeia.

O interesse pela região envolve, em especial, o controle do Porto de Sebastopol, que além de valor histórico e turístico, tem localização estratégica, uma vez que é a principal base para a frota russa no Mar Negro, possibilitando acesso direto ao Mediterrâneo.

O porto é bastante utilizado para o transporte de gás natural, bem como para o escoamento de produção, em especial de “recursos minerais metálicos, energéticos e grãos”, disse Menezes.

“Se somarmos a incorporação da Ucrânia aos territórios de Donetsk, Donbass [no Leste ucraniano] e de outras áreas coladas a essas províncias, já temos cerca de um quinto do território ucraniano tomado à força pela Rússia”, acrescenta o professor.

Professor de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), Ricardo Caichiolo explica que o conflito entre Rússia e Ucrânia resultou em “modificação significativa no cenário geopolítico mundial”, o que, segundo ele, acabou por se refletir, também de forma significativa, na economia mundial, “com aumento dos preços de forma generalizada”.

“Praticamente o mundo inteiro passa por um processo inflacionário em suas economias internas, com aumentos nos preços de alimentos e do petróleo”, disse. “E a questão energética está muito sensível, principalmente na Europa, que ainda passa por um inverno, com problemas no fornecimento de gás que vinha da Rússia”, afirmou, referindo-se ao corte no fornecimento de gás russo para a Europa.

O Brasil também sentiu os efeitos da guerra em sua economia. “Obviamente fomos e continuamos impactados pelo conflito”, diz Caichiolo.

“Houve aumento da inflação e, então, medidas foram tomadas, comoo  aumento significativo da taxa de juros, o que causa impacto negativo no aumento da produção e no desenvolvimento das atividades econômicas dentro do país”.

“Em termos geopolíticos, o Brasil, ao longo do governo anterior [o de Jair Bolsonaro], se manteve com discurso relativamente neutro e, em alguns momentos, sinalizando apoio à Rússia para a garantia de envio de fertilizantes”, acrescentou, referindo-se à movimentação do então presidente em favor do interesse do agronegócio brasileiro.

Na opinião de Roberto Menezes, da UnB, “o Brasil não é neutro nesse conflito”. “O então presidente Jair Bolsonaro inclusive tomou o lado do mais forte, que é o da Rússia. Fomos muito comedidos quando era para condenar a invasão do território ucraniano. Tanto é que Bolsonaro não esteve na Ucrânia. Ele poderia ter saído da Rússia e ido à Ucrânia naquele momento em que a guerra não havia começado ainda. Mas preferiu sair de Moscou e foi direto à Hungria encontrar-se com seu aliado da extrema direita, Viktor Orbán”.

Já o governo Lula, segundo Menezes, adotou posição de condenação do conflito, mas mantendo “equidistância, exatamente para defender [a instituição de] um clube da paz”. Lula tem defendido publicamente a criação de um grupo, formado por países não envolvidos na guerra, para mediar uma saída pacífica para o conflito.

“O que ele está defendendo não é um voluntarismo do Brasil, mas que a diplomacia volte ao primeiro plano nesse conflito. E que, pela via diplomática, envolvendo países como Índia, Turquia, México, Indonésia e China, tenhamos pelo menos a possibilidade de abrir uma mesa de negociação entre Rússia e Ucrânia”, afirmou.

Menezes diz acreditar que o Brasil possa, de fato, ter um papel que vá além de mediador, “podendo contribuir, enquanto potência média, para, pelo menos, tentar equalizar alguns pontos, tanto da Rússia quanto da Ucrânia”, com a ajuda do grupo.

Ele lembrou que o Brasil optou por não enviar armamentos. “Isso mostra a posição do país, até este momento diplomático, de reiterar aquilo que fez em 1991 na Guerra do Golfo, quando o então presidente Fernando Collor manifestou posição contrária à guerra. Em 2003, na Guerra do Iraque, e agora, no atual conflito, Lula adotou a mesma posição”, complementou.

Por  Estadão

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‘Não vou me silenciar’, diz Kamala a primeiro-ministro de Israel sobre Gaza

Kamala Harris se reuniu com o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, na Casa Branca, nesta quinta-feira (25).

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A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, disse que não se silenciaria em relação à crise humanitária na Faixa de Gaza ao se reunir com o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, na Casa Branca, nesta quinta-feira (25).

O encontro era observado de perto por analistas, que buscavam ali indícios de possíveis reformulações da política externa americana em relação ao Estado judeu caso a provável candidata do Partido Democrata à Presidência vença as eleições em novembro. Kamala foi, afinal, uma das primeiras líderes de destaque dos EUA a pedir um cessar-fogo na guerra Israel-Hamas.

Segundo a própria vice, seu diálogo com Netanyahu foi “franco e construtivo”. “Israel tem o direito de se defender. Mas como isso é feito importa. Deixei claras as minhas grandes preocupações com a gravidade da situação humanitária lá”, disse ela a jornalistas após o encontro.

Desde o começo da guerra, em outubro passado, mais de 39 mil pessoas morreram em Gaza segundo os cálculos das autoridades locais, ligadas ao grupo terrorista Hamas.

A ONU estima que 2 milhões do total de 2,2 milhões habitantes da faixa tenham sido obrigados a deixar suas casas, e a destruição causada por tanques e bombas israelenses não só devastou as paisagens como desmantelou sistemas de serviço básico, incluindo o acesso à água potável.

Relatório mais recente do braço do organismo para a alimentação e agricultura, FAO, aponta que 96% da população do território palestino -ou 2,1 milhões de pessoas- enfrentam insegurança alimentar aguda.

O tom incisivo relatado pela vice contrasta com a postura que o presidente Joe Biden demonstrou ao conversar com Bibi, como o dirigente israelense é conhecido, no Salão Oval horas antes.

Foi o primeiro encontro presencial entre os líderes desde outubro do ano passado, quando a guerra em Gaza teve início. Biden viajou até Israel nas primeiras semanas depois da eclosão do conflito, numa operação com segurança reforçada em que buscava demonstrar o apoio inegociável da maior potência militar do globo a seu principal aliado no Oriente Médio.

Então, o americano abraçou Bibi, como o líder israelense é conhecido, e prometeu auxiliá-lo. Ao menos diante das câmeras, o americano manteve nesta quinta o tom amistoso daquela ocasião e, de acordo com relato do jornal The New York Times, abriu um sorriso largo ao dar as boas-vindas ao israelense.

Ainda assim, suas palavras a Bibi, “temos muito o que conversar” -repetidas com exatidão por Kamala mais tarde-, davam um indício da tensão que os países vêm acumulando nos últimos tempos.

Integrantes do governo afirmaram que o principal assunto do encontro entre Biden e Netanyahu foi a tentativa de firmar um novo acordo de cessar-fogo entre Israel e o grupo terrorista Hamas, estagnada há meses.

Antes de se sentarem no Salão Oval, os governantes haviam se reunido com parentes de reféns americanos mantidos em cativeiro pelo Hamas. Representantes das famílias disseram a jornalistas que reforçaram o pedido por uma trégua que previsse a libertação dos sequestrados.

Washington é o maior aliado externo de Tel Aviv desde os anos 1970. A relação entre os dois países já passou por muitos altos e baixos mas, desde a Segunda Guerra Mundial, Israel foi o Estado que mais recebeu ajuda direta dos EUA no mundo.

Ao responder Biden, Netanyahu citou justamente esse histórico. “Quero agradecê-lo por seus 50 anos de serviço público [Biden entrou na política 52 anos atrás, ao ser eleito senador por Delaware] e 50 anos de apoio ao Estado de Israel.”

O israelense chegou a Washington após semanas de grandes reviravoltas na política interna americana, a mais recente das quais foi o anúncio de Biden de desistir de disputar as eleições, abrindo caminho para Kamala.

O premiê esperou mais de seis meses só para receber um convite para visitar a Casa Branca, muito mais do que o usual para ocupantes de seu cargo. Até Isaac Herzog, o presidente de Israel -uma função sobretudo cerimonial- foi convocado para ir a Washington antes dele, em julho do ano passado.

A demora de Biden para fazer o convite a Netanyahu foi um dos marcos dos desentendimentos entre os dois líderes, iniciados pouco depois que o israelense voltou ao posto de primeiro-ministro, no final de 2022.

Seu governo, o mais à direita da história de Israel, liderou uma ofensiva contra o Judiciário logo após ele assumir, uma iniciativa que foi publicamente criticada pelo presidente americano.

A guerra em Gaza, cujo estopim foi uma incursão do Hamas ao sul de Israel que deixou cerca de 1.200 mortos, no ataque mais letal a judeus desde o Holocausto, tinha a princípio voltado a unir os líderes. Mas a continuidade do conflito na faixa vinha sendo motivo de repreensões cada vez mais duras por parte de Biden.

Netanyahu viaja à Flórida nesta sexta (26) para um encontro com o candidato republicano à Presidência, Donald Trump.

Foto Getty

Por Folhapress

           

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Entenda como funciona e quais as críticas à eleição na Venezuela

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Questionado por potências como Estados Unidos e União Europeia, o sistema eleitoral da Venezuela tenta provar neste domingo (28) que é seguro e que o voto da população não pode ser violado. Mas, afinal, como funciona o sistema eleitoral da Venezuela?

Inicialmente, o eleitor apresenta sua identidade e faz o reconhecimento biométrico por meio da impressão digital. Em seguida, vai até a urna eletrônica e computa seu voto. Depois, o voto é impresso em papel e o eleitor pode conferir se ele está correto. Por último, ele deposita o voto impresso em outra urna.

Os votos computados eletronicamente são enviados por sistema próprio – sem conexão com a internet – para uma central que totaliza todos os votos. Posteriormente, é feita uma verificação, por amostragem, para saber se os votos enviados pela urna eletrônica são os mesmos depositados, em papel, na urna que fica ao lado da máquina.

Pesa contra esse sistema, o fato de parte da oposição venezuelana denunciar supostas fraudes, pelo menos, desde 2004 – com exceção de 2015 quando venceram o pleito para Assembleia Nacional. A favor do sistema eleitoral venezuelano, há especialistas e organizações que apontam não existirem provas ou razões para acreditar que o voto seja violado, apesar de apontarem outros problemas relacionados às eleições no país.

Em 2012, o sistema eleitoral venezuelano foi elogiado pelo ex-presidente dos EUA Jimmy Carter, que coordena o Centro Carter, responsável por monitorar eleições em todo o mundo.

“Não temos dúvidas, temos monitorado muito de perto o processo eleitoral e ele [o ex-presidente Hugo Chávez] venceu de forma justa e direta. Na verdade, das 92 eleições que monitoramos, eu diria que o processo eleitoral na Venezuela é o melhor do mundo”, afirmou o ex-presidente.

Venezuela's President Nicolas Maduro attends an event, in Caracas, Venezuela April 13, 2023. Reuters/Leonardo Fernandez Viloria/Proibida reprodução
Nicolás Maduro, presidente do país, é candidato à reeleição. Foto: Reuters/Leonardo Fernandez Viloria/Proibida reprodução

Por outro lado, em 2021, o Centro Carter emitiu relatório sobre as eleições municipais e estaduais venezuelanas com críticas à um “padrão de repressão política”, de “direitos severamente restringidos à participação política” e à “liberdade de expressão”. Porém, não questionou a segurança do voto em si.

“O sistema eleitoral da Venezuela é totalmente automatizado e o CNE [Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela] audita todas as fases do processo”, informou o comunicado do Centro Carter, em 2021, acrescentando que “uma série de auditorias foram realizadas durante e após o processo eleitoral, na presença de especialistas, representantes de partidos e observadores. Todos os auditores concordaram que o sistema de votação eletrônica é seguro”.

Oposição audita eleição

O professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Central de Venezuela (UCV), Rodolfo Magallanes, destacou à Agência Brasil que o fato de a oposição monitorar todo o processo e participar da auditoria das urnas é a principal garantia de que o voto não é violado.

“Os setores opositores acompanham todo o processo ao longo de auditorias do sistema em todos os momentos, inclusive no período pré-eleitoral. Isso oferece garantias a todos os setores de que sua decisão vai ser respeitada”, ressaltou o cientista político.

Neste ano, a oposição registrou observadores para todas as mais de 30 mil mesas eleitorais do país. “Conseguimos, graças a nossos voluntários, obter as credenciais de todas as testemunhas”, informou o principal candidato opositor, Edmundo González.

Segundo o pesquisador Rodolfo Magallanes, a oposição tem participado de todas as mais de dez auditorias ao longo do processo. “Isso se verifica nos documentos publicados na página do CNE. A oposição tem firmado os documentos que validam as auditorias”, disse.

A segurança do voto na Venezuela é respaldada pelo Observatório Global de Comunicação e Democracia, organização não governamental que monitora eleições na América Latina. De acordo com a diretora-geral da organização, Griselda Colina, “o sistema [de votação automatizada] foi auditado, o sistema vai funcionar. O problema está no entorno e ao redor do processo de votação”.

Venezuelan opposition presidential candidate Edmundo Gonzalez and Venezuelan opposition leader Maria Corina Machado greet supporters during a prayer rally in Caracas, Venezuela July 21, 2024. Reuters/Gaby Oraa/Proibida reprodução
Edmundo Gonzalez é o principal candidato da oposição. Foto: Reuters/Gaby Oraa/Proibida reprodução

Pressão política

Segundo a especialista, entre as limitações do processo eleitoral venezuelano, estão “a coerção aos eleitores em lugares controlados pelo governo, a extensão do horário de abertura dos colégios eleitorais e a limitação do acesso de observadores”.

Nas eleições locais de 2021, uma das críticas registradas pelos observadores nacionais e internacionais foi em relação aos “pontos vermelhos”, que são estruturas montadas pelo PSVU (partido do governo) próximos aos locais de votação.

“Esses locais foram criticados pela oposição como um método para rastrear os eleitores e correlacionar a votação com benefícios do governo”, diz o documento do Centro Carter. A organização, por outro lado, elogia os procedimentos para recursos e contestações dentro do pleito, dizendo que “geralmente estão alinhados com os padrões internacionais e melhores práticas”.

Uma Missão de Observação Eleitoral (MOV) da União Europeia analisou as eleições municipais e estaduais de 2021. Os especialistas europeus registraram alguns problemas, como o cancelamento de registros de candidatos e o desigual acesso à recursos do Estado e aos meios de comunicação, com candidatos ligados ao oficialismo tendo mais espaço e recursos.

Porém, a comitiva da UE não apontou para uma possível violação do voto. “Uma auditoria exaustiva do sistema automatizado de votação, realizada por especialistas acadêmicos, concluiu que o sistema garante a integridade do voto”, diz o comunicado europeu.

Os especialistas do Centro Carter, por sua vez, citaram que a inclusão de dois juízes no CNE, ligados à oposição a partir do pleito de 2021, deu mais confiança e maior credibilidade ao órgão. “O governo ainda mantém o poder no CNE, mas a comissão é menos tendenciosa do que tem sido nas últimas décadas”, disseram.

Denúncias de fraude

O Centro Carter, apesar de registrar que organizações da sociedade civil e grupos de observadores locais documentam “milhares de irregularidades”, afirmou que essas denúncias não são formalizadas. “Não foram apresentadas queixas formais, o que demonstra um baixo grau de confiança no sistema”, avaliou o relatório de 2021.

O cientista político venezuelano Rodolfo Magallanes disse que as denúncias da oposição sobre fraudes nas eleições anteriores nunca foram formalizadas ou levadas adiante.

“Essas denúncias não chegam a nenhum lugar porque não se apresentam maiores evidências. Ou seja, se faz um comentário para tentar jogar dúvidas sobre os resultados eleitorais, mas não estão acompanhadas de uma denúncia formal”, contou.

O pesquisador acrescentou que denúncias de fraude sem provas por parte de um candidato perdedor ocorreram também nos EUA, quando Donald Trump perdeu para Joe Biden, em 2020, e no Brasil, quando Jair Bolsonaro perdeu para Luiz Inácio Lula da Silva, em 2022.

Magallanes lembrou ainda que a denúncia da empresa Smartmatic – que prestava soluções tecnológicas ao CNE, também não foi acompanhada de evidências e que nem a oposição deu continuidade à denúncia.

Em 2017, funcionários da Smartmatic afirmaram, em Londres, três dias após a votação, que os resultados da eleição para Assembleia Nacional Constituinte teriam sido manipulados. Na época, a oposição boicotou o pleito e o chavismo foi às urnas sem concorrentes.

Observadores eleitorais

As eleições deste ano devem contar com observadores independentes nacionais e internacionais. Entre as instituições nacionais, estão a Rede de Observação Eleitoral Assembleia de Educação (ROAE), a Fundação Projeto Social, a Associação Venezuelana de Juristas e o Centro Internacional de Estudos Superiores.

Sobre os observadores nacionais, a especialista Griselda Colina explicou que, com exceção da Rede de Observação Eleitoral, há pouca informação sobre os demais grupos.

Entre os observadores internacionais, além do Centro Carter, estão técnicos das Nações Unidas que formam o Painel de Especialistas Eleitorais da ONU. A comitiva da União Europeia, inicialmente prevista para participar do pleito, foi vetada pelo governo venezuelano após o bloco renovar sanções econômicas contra o país caribenho.

Já o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do Brasil desistiu de enviar observadores depois que Nicolás Maduro, presidente do país e candidato à reeleição, ter declarado que de o sistema eleitoral brasileiro não seria auditável. A Corte Eleitoral afirmou que a declaração de Maduro é falsa. “A Justiça Eleitoral brasileira não admite que, interna ou externamente, por declarações ou atos desrespeitosos à lisura do processo eleitoral brasileiro, se desqualifiquem com mentiras a seriedade e a integridade das eleições e das urnas eletrônicas no Brasil”, afirmou o TSE, em nota.

Já o governo brasileiro deve enviar o assessor internacional da Presidência da República, o embaixador Celso Amorim.

O diretor Eugenio Martínez, do Votoscopio, outra organização especialista em eleições, destacou que a maioria das missões de observação tem “acompanhamento político”. Para ele, apenas o Painel de Especialistas Eleitorais da ONU e o Centro Carter são observadores internacionais técnicos autorizados a avaliar a votação deste domingo.

Sem acordo

Dos dez candidatos que concorrem à presidência da Venezuela neste ano, dois não assinaram um acordo para reconhecer o resultado eleitoral, incluindo o principal candidato da oposição, Edmundo González.

“Firmar um acordo para que? O primeiro que viola os acordos, que assina, é o governo. Temos os Acordos de Barbados que se tornaram letra morta”, disse a jornalistas, segundo o veículo Voz da América. O Acordo de Barbados foi o compromisso firmado entre governo e oposição para o pleito deste ano.

A man receives a flyer of the electoral ballot for the Presidential elections of July 28, in Caracas, Venezuela, July 17, 2024. REUTERS/Leonardo Fernandez Viloria
Venezuelanos irão às urnas no domingo (28) para escolher presidente. Foto: Reuters/Leonardo Fernandez Viloria/Proibida reprodução

Ao mesmo tempo, o chefe da campanha de Maduro, Jorge Rodríguez, denunciou um suposto plano da oposição para não reconhecer o pleito.

“É curioso que um dos dez candidatos já esteja a fazer toda uma farsa para dizer que houve fraude nas eleições, porque eles, e nós sabemos, quais são as verdadeiras pesquisas. Todas essas agências internacionais estão encarregadas de criar uma mentira que afetará e atacará o processo eleitoral venezuelano”, afirmou em uma coletiva de imprensa.

As pesquisas eleitorais na Venezuela divergem em relação ao resultado, umas dão vitória para o presidente Maduro e outras para Edmundo González.

Embargo econômico

Para o cientista político Rodolfo Magallanes, o sistema eleitoral venezuelano tem se mostrado seguro e confiável, mas as sanções econômicas tolhem o direito político da população.

“Até certo ponto não existe uma liberdade absoluta para o eleitor venezuelano emitir um voto sem sentir-se, de alguma forma, pressionado. Se você tem sanções externas sobre teu país, não existe a liberdade que um eleitor aspira para tomar decisões”, comentou.

A Venezuela enfrenta, desde agosto de 2017, em bloqueio internacional que limita o acesso ao mercado de crédito global e, desde janeiro de 2019, também ao mercado de petróleo e outros minerais.

Fonte: Agência Brasil

           

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‘Sou a garantia de paz e estabilidade’, diz Maduro em pronunciamento na TV

A declaração pareceu mais uma tentativa de se distanciar da ideia de violência que Maduro projeta na oposição.

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O ditador Nicolás Maduro fez um pronunciamento nesta quinta-feira (25) -último dia de campanha na Venezuela antes das eleições no próximo domingo (28)- cheio de referências à paz, após subir o tom contra seus adversários.

“Sou a garantia de paz e estabilidade”, afirmou o líder ao apresentar seu plano de governo composto pelo que chama de sete transformações -dentre elas, “mais democracia”. “Este plano articula sete dimensões de uma Venezuela pujante e tem um só objetivo: consolidar a paz e um novo modelo econômico.”

A declaração pareceu mais uma tentativa de se distanciar da ideia de violência que Maduro projeta na oposição.

“Os anos de bloqueio levaram nossa pátria a situações extremas, como tentativas de magnicídio e guarimbas [tipo de protesto com barricadas usado pela oposição]”, afirmou o ditador, associando seus adversários a “tendências fascistas” e à extrema direita, como costuma fazer.

“Sou o único candidato que tem um plano feito na Venezuela”, declarou. A insinuação de que as propostas da oposição tenham sido feitas do exterior também fez parte da sua retórica. “[O plano] é produto de um encontro de todos os setores e de todos os territórios e, mais importante ainda, entre homens e mulheres venezuelanos que são os únicos protagonistas desta história.”

O pronunciamento, ao meio-dia local (13h de Brasília), foi feito do Palácio Miraflores, sede da Presidência, e contou com vários elementos caros ao chavismo. A abertura do vídeo mostra um quadro do herói nacional Simón Bolívar (1783-1830) para, em seguida, Maduro apresentar espadas do líder que encabeçou o movimento de independência da Venezuela.

Na mesa daquele local, Maduro disse ter se reunido com o ex-líder Hugo Chávez (1954-2013) em dezembro de 2012. “Foi aqui que ele me disse: ‘Se por alguma razão eu não puder continuar, você segue'”, afirmou. Na cadeira presidencial, afirmou, sentaram por 168 anos “marionetes das oligarquias” até seu antecessor chegar ao poder. “E aqui estou pela vontade do povo.”

Nos últimos dias, referências de Maduro a um “banho de sangue” em uma suposta guerra civil caso a oposição ganhe provocou rusgas até mesmo com políticos dos quais já foi próximo na região, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente da Argentina Alberto Fernández.

“Fiquei assustado com as declarações […]. Quem perde as eleições toma um banho de votos, não de sangue. Maduro tem de aprender: quando você ganha, você fica. Quando você perde, você vai embora e se prepara para disputar outra eleição”, disse o petista, posteriormente ecoado por Fernández.

Nesta quinta, o presidente do Chile, Gabriel Boric, também mencionou o brasileiro ao falar da Venezuela. “Apoio as afirmações de Lula de que aqui não podemos ameaçar banhos de sangue sob nenhum ponto de vista. O que os dirigentes e candidatos recebem são banhos de votos”, afirmou o chileno em uma entrevista coletiva ao lado de seu chanceler.

A escalada de tensão com o Brasil envolveu declarações de Maduro que colocaram em xeque o sistema eleitoral brasileiro, seguidas da desistência do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de enviar observadores para a votação.

“Em face de falsas declarações contra as urnas eletrônicas brasileiras que, ao contrário do que afirmado por autoridades venezuelanas, são auditáveis e seguras, o TSE não enviará técnicos para atender convite feito pela Comissão Nacional Eleitoral daquele país e acompanhar o pleito do próximo domingo”, disse o tribunal em nota divulgada na noite desta quarta (24).

Foto Getty

Por Folhapress

           

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