De acordo com a OMS, se a tuberculose não for tratada, a letalidade é alta – podendo chegar a 50% dos casos. Por outro lado, cerca de 85% dos casos tratados adequadamente evoluem para a cura. A principal dificuldade, no entanto, é a adesão correta ao tratamento, que envolve o uso contínuo de antibióticos por pelo menos seis meses, podendo ser prorrogado por mais um período, se for o caso de infecção resistente ao medicamento-padrão.
O esquema básico consiste em duas fases de tratamento: a intensiva, que dura quatro meses, com comprimidos associados com quatro antibióticos, e a de manutenção, que dura mais dois meses, com dois antibióticos associados.
“Talvez o longo tempo de tratamento seja uma das razões para o indivíduo abandonar os cuidados. Outro ponto é que, com pouco tempo de uso das medicações, a pessoa já melhora clinicamente, resultando na falsa sensação de cura. Mas a pessoa ainda não está curada e, sem o tratamento, a doença vai reaparecer após alguns meses”, explica a infectologista, que alerta que esse é um risco para a resistência ao tratamento.
“Indivíduos que abandonam e reiniciam tratamentos ao longo do tempo podem evoluir com a temida tuberculose resistente, com a necessidade de adaptação do esquema antibiótico e, eventualmente, aumentando o tempo de tratamento.”
Em setembro de 2023, o SUS incorporou uma nova medicação importante para o arsenal de tratamento da tuberculose multirresistente, a pretomanida, que é administrada via oral e pode encurtar o tempo de tratamento dessa condição, além de reduzir o número de visitas de acompanhamento.
Segundo a infectologista ouvida pela Agência Einstein, ainda há uma demora no diagnóstico da tuberculose porque ela costuma ser erroneamente tratada como pneumonia.
“Nesses casos, o antibiótico até possui uma ação no combate ao bacilo, mas, logo terminado o tratamento, os sinais e sintomas voltam. Como a suspeita é de pneumonia, muda-se o antibiótico, num ciclo sem fim. É preciso compreender que a tuberculose está presente em todas as camadas da população, em todas as idades, e a conscientização da população e dos profissionais de saúde é primordial para que o diagnóstico seja realizado no momento apropriado, assim como o tratamento”, alerta a médica, que ressalta que um indivíduo com tuberculose pulmonar ou laríngea sem tratamento acaba contaminando ao final de um ano, em média, de dez a 15 pessoas.
Comprometimento da renda
Apesar de o diagnóstico e o tratamento serem fornecidos pelo SUS de forma gratuita, um estudo realizado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) apontou que quase metade das famílias de pacientes gasta cerca de 20% da renda anual com os “custos extras” do tratamento, incluindo os gastos diretos (consultas e exames extras), os não médicos diretos (transporte, alimentação, acomodação e compra de suplementos alimentares, entre outros) e os custos indiretos (privação de renda por causa da perda do emprego, por exemplo).
Segundo o levantamento, os gastos extras anuais somaram, em média, R$ 8.118,74, quase sete vezes o valor do salário-mínimo na época (2021).
“Esse estudo traz à tona pontos importantíssimos, pois os pacientes, principalmente os de baixa renda, enfrentam dificuldades relacionadas ao dia a dia do tratamento, como o deslocamento para as unidades de saúde, os impactos do desemprego ou mesmo dos dias perdidos no trabalho durante o período do isolamento (14 dias após o início das medicações)”, comenta a infectologista.
Segundo ela, esses pacientes também podem enfrentar problemas de debilidade clínica da própria doença ou o manejo dos efeitos colaterais eventuais das medicações.
O estudo mostra ainda que, se o paciente tiver coinfecção pelo HIV e for trabalhador autônomo, praticamente triplicará o risco de a família apresentar gastos definidos como catastróficos.
“A coinfecção pelo HIV traz um ponto de maior criticidade, talvez pelas interações medicamentosas com a terapia antirretroviral e a necessidade de um monitoramento nos centros especializados de tratamento em aids, unidades que nem sempre estão próximas à residência dos pacientes, ou muitas vezes disponíveis somente em outros municípios. O trabalhador autônomo tem outro ponto: ele não possui licença médica remunerada, e dias de consulta significam dias não trabalhados”, diz a infectologista.
O que diz o Ministério da Saúde
Apesar do retrocesso com aumento de casos e de mortes, o Ministério da Saúde informou em nota que “o Brasil está entre os 13 países que conseguiram recuperar a detecção de pessoas com tuberculose após a pandemia de Covid-19, o que é fundamental para agilizar o tratamento dos pacientes”.
O governo também atribui à pandemia o aumento nos óbitos. “Os serviços de saúde foram impactados pela emergência de saúde pública, possivelmente reduzindo sua capacidade em diagnosticar precocemente os casos ocorridos em 2020, resultando em condições clínicas mais graves da tuberculose e piores prognósticos no tratamento”, avalia.
O Ministério da Saúde informou ainda que, “de forma inédita, 14 ministérios se reuniram para elaborar estratégias de eliminação da tuberculose e outras dez doenças e cinco infecções de transmissão vertical que acometem de forma mais intensa as populações em situação de vulnerabilidade social por meio do Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente (CIEDDS), que foi instalado em abril de 2023. Coordenado pelo Ministério da Saúde, o grupo tem previsão de funcionar até janeiro de 2030”.
O governo acrescentou também que outra ação essencial para evitar casos graves de tuberculose é recuperar as altas coberturas da vacina BCG, que possui a indicação de uma dose para recém-nascidos.
Até 2018, esse índice se mantinha acima de 95%, a meta estabelecida pelo ministério. Entretanto, a partir de 2019, a cobertura não ultrapassou os 88% (no ano passado ficou em 76,24%) e os dados referentes a 2024 apontam uma cobertura vacinal de somente 65,59%.
“O estigma e a discriminação são as grandes barreiras para o controle e o combate da tuberculose. Além disso, a falta de uma vacina efetiva para a prevenção da forma pulmonar da tuberculose dificulta a redução de casos e a eliminação da doença, assim como a não-existência e a falta de desenvolvimento de medicamentos para o tratamento de curta duração”, finalizou a nota.
Fonte: Agência Einstein
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