No século dezenove ao anoitecer na pacata Vila de Belmonte tudo ficava realmente escuro. Excetuando-se as pequenas lanternas de mão costumeiramente carregadas quando, corajosamente, alguém andava pela rua à noite, podia ver poucas luzes através de frestas de portas e janelas – eram velas de cera de carnaúba em castiçais, pequenas candeias sobre as mesas das casas ou presas às paredes, quem sabe algum candeeiro fumarento. Defronte das casas, apenas tochas, eram colocadas quase sempre nos dias festivos.
O combustível para isso era naturalmente economizado, fosse o precioso azeite, quase nunca usado (era caro, vinha do Reino), ou mais comum, óleo de baleia. Naquele tempo as pessoas tinham pavor de sair de casa à noite. Não era ainda a violência que afastava os moradores das ruas durante a noite e os levava a recolherem-se cedo, era sim a falta de opção de lazer público e algumas crenças sobrenaturais, geralmente associadas à noite e a escuridão. O medo noturno naquele tempo relacionava-se muito as lendas, superstições e histórias de assombração que habitavam o universo mental, integrando o conjunto de crenças e costumes locais. O lobisomem as visagens que são assombrações, ou almas penadas, faziam parte desse universo sobrenatural nas noites escuras dos belmontenses.
Na segunda década do século vinte, depois de superado os rigores da grande seca de 1915, O Conselho municipal de Vereadores do Município de Belmonte durante a gestão do prefeito Francisco Alves de Carvalho Pires (Chico do Mandacaru) anunciou a instalação da iluminação pública através de uma lei municipal em 9 de julho de 1921. A rua principal de Belmonte passou a ser iluminada por 10 lampiões de zinco pintados de preto, com vidros nas laterais de proteção, dependurados em postes de madeira. O novo sistema de iluminação foi inaugurado no dia 24 de dezembro de 1921 depois da tradicional missa do galo. Afora isso, só a lua e as estrelas. Na parte central da cidade, os postes guardavam entre si uma distância de 100 metros, localizados na maioria das vezes nas esquinas, com uma altura de aproximadamente 2,5 metros. Todos os dias após o meio-dia o responsável, que no início era o senhor João Nunes de Magalhães, ia de poste em poste a fim de efetuar a limpeza dos vidros e colocar querosene nos lampiões. Ao cair da noite refazia o trajeto, parte por parte, para acender a modesta luz.
Mesmo com esse sistema, a luz era mortiça e piorava em noites com neblinas. Os vereadores da Câmara de Belmonte tentaram coibir os atos de alguns vândalos que depredavam os postinhos do frágil sistema. Existia uma lei criada em 1924 que “impunha multa às pessoas que fizesse qualquer dano aos lampiões, bem como obrigava a pôr os mesmos no estado em que estavam antes.”
No dia da inauguração da iluminação pública de Belmonte, naquele natal do ano de 1921, madrinha Adauta Meneses de saudosa memória tinha 9 anos de idade e lembrava muito bem do fato: “Luz! Os postes de madeira foram colocados na rua principal de Belmonte. Eu ficava maravilhada com aquelas “estrelas” tão próximas, possíveis de serem tocadas. Os adultos diziam: É obra do governo, o progresso chegou. Depois de muita admiração e já acostumados com a novidade, os belmontenses voltaram a sua rotina.”
Depois de alguns anos surge o advento do petróleo e as residências que eram iluminadas com candeeiro e lamparina a base de azeite de mamona, passaram a ser iluminadas a querosene.
Em 1938 o prefeito Vécio Alves de Menezes, em virtude da implantação da Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro – SANBRA adquiriu para a cidade de Belmonte um locomóvel, movido a lenha que passou a fornecer energia somente por poucas horas. O motor começava a funcionar às 6 horas da noite e ia até as 10 horas da noite. Às 9 horas, com uma hora de antecedência, era dado o aviso com a interrupção da luz durante alguns segundos para que os candeeiros ou as lamparinas fossem preparados. Às dez horas a cidade estava novamente às escuras.
Na gestão do prefeito Hermes Primo de Carvalho, na década de 50, o locomóvel movido a lenha foi substituído por um grupo-gerador Diesel, que permaneceu até a chegada da energia de Paulo Afonso em 1966, durante a gestão do prefeito José Alencar de Carvalho em decorrência da instalação de uma empresa siderúrgica no município e que originou a FERGUSA.
Um dos acontecimentos mais importantes para a nossa cidade foi sem dúvidas à chegada da energia da CHESF ou da luz de Paulo Afonso, como era chamada a energia elétrica de São Francisco. O fato ocorreu no ano de 1966. A solenidade de implantação da energia de Paulo Afonso foi organizada pela primeira dama do município a senhora Maria de Lourdes Carvalho e contou com a presença de importantes políticos do estado além de diversas autoridades. Alguns fizeram discursos ufanistas, agradecendo os esforços do presidente da república e do governo do estado. Foi tudo muito correto, sem disputas políticas e com muitos aplausos da grande multidão presente.
Era um momento de euforia geral e os belmontenses estavam agradecidos. A chegada da energia de Paulo Afonso foi um marco no desenvolvimento de nossa cidade. Desde então houve uma grande transformação em São José do Belmonte e no modo de viver dos belmontenses. A primeira transformação foi à substituição dos acanhados postes de madeira, e sua iluminação fraca, por bonitos postes de concreto armados com lâmpadas brilhantes. Outra transformação imediata foi à desativação do enorme gerador de energia instalado num prédio onde tempos depois surgiu a SOCIEDADE OPERÁRIA BELMONTENSE – SOB, cujo responsável pela manutenção do gerador era o Sr. Expedito e que por isto ficou sendo conhecido como Expedito do Motor.
A nova energia era ininterrupta e não servia apenas para iluminação. Com ela foi possível adquirir as modernas maravilhas de eletrodomésticos já existentes nas capitais e que faziam a cabeça das donas de casa das classes mais abastadas da cidade. Foi uma correria às compras de geladeiras, enceradeiras, liquidificadores, batedeiras de bolo, ferros de engomar, ventiladores…Paralelamente, foram substituídos o candeeiro, a lâmpada petromax, o ferro de engomar a carvão, a geladeira a querosene, e até as velas de cera que iluminavam os quadros e imagens de santos durante à noite. Os bares e sinucas também passaram a funcionar até altas horas e novos bares e até sorveterias foram inaugurados como a sorveteria de Zé Carvalho e a de Seu Domingos. Também o Ginásio Municipal Dr. Arcôncio Pereira que funcionava somente a noite estendeu o seu horário até mais tarde que o horário de costume. A Praça Pires Ribeiro recebeu uma nova iluminação e passou a ser mais freqüentada até tarde da noite. Nos finais dos anos 60, o sinal da televisão começou a ser captado em Belmonte. De início de forma precária, com mais chuviscos do que imagem. Mesmo assim muita gente comprou os primeiros aparelhos de televisão. Afinal de contas, ter um aparelho de televisão na sala principal da casa era símbolo de status. Em julho de 1969 a cidade pode assistir a transmissão ao vivo do grande acontecimento mundial da chegada do primeiro homem à lua. As donas de casa passaram também a ficar viciadas em novelas, a da época que arrancou muita emoção e lágrimas das telespectadoras foi “Antônio Maria”. Em junho de 1970 Belmonte acompanhou com muita expectativa a Copa do Mundo. Serra Talhada vinha em peso para nossa cidade assistir os jogos do mundial, pois lá não havia chegado ainda o sinal da televisão.
Deslumbramento e euforia popular marcaram o aparecimento da eletricidade em Belmonte, tida como a representação do moderno, do futuro e do progresso. Um fenômeno que foi acompanhado pela transformação de hábitos, comportamentos e costumes. O advento da energia elétrica aparece como um divisor de águas na trajetória do crescimento do município e marca o início de uma nova fase na cidade de São José do Belmonte.