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“Quantos habitantes há na cidade?” Desde 2019, responder a essa simples pergunta tem sido motivo de dor de cabeça para quem mora em Ferreiros, na Zona da Mata de Pernambuco. Quem vive nos outros 183 municípios do Estado, facilmente resolve a questão nos sites das prefeituras ou do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), órgão oficial encarregado de medir a população de todas as cidades brasileiras. No entanto, sobre Ferreiros, não há consenso.
A confusão acontece porque o município tem uma população estimada em 12.216 habitantes pelo IBGE, mas também tem uma população judicial, ou seja, determinada pela Justiça, que pode ser cerca de 39% superior a isso: entre 13.585 e 16.980 habitantes. Os números foram divulgados na última sexta-feira (27).
A diferença de até 4,7 mil pessoas existe desde que a cidade foi à Justiça questionar informações e documentos repassados pela Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco (Condepe/Fidem) ao IBGE. Segundo tais dados, a área territorial do município é menor que a defendida pela prefeitura. Assim, um pedaço de Ferreiros, na verdade, pertenceria à vizinha Timbaúba, acarretando a diminuição da população residente dentro dos limites de Ferreiros.
Além disso, a ação, que tramita no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que tem sede no Recife, pede que o IBGE desconsidere um ofício da Condepe/Fidem, no qual a agência defende que o IBGE utilize, como base para estimar a população ferreirense, utilize o censo demográfico de 2010. “O único que pacificamente é o mais errado de todas as análises”, segundo trecho do recurso apresentado pela prefeitura ao TRF5. Por isso, a Justiça “aumentou” a população da cidade e determinou que a desconsideração de todas as estimativas posteriores a 2019 feitas pelo IBGE.
De acordo com a gerente de planejamento e gestão do IBGE em Pernambuco, Fernanda Estelita, a diferença entre os números da prefeitura e do instituto tem relação com a metodologia adotada para chegar até eles. “A estimativa da prefeitura acontece a partir de registros administrativos, e não temos como fazer essa comparação nesse sentido. Só temos, realmente, uma certeza quando é feito um novo censo”, explica ela, listando dados como matrículas escolares e número de eleitores, entre os registros administrativos. “Eles não dão uma segurança para fazermos esse tipo de comparação”, emenda.
“Além disso, a população desse município pode ter crescido graças a um novo polo econômico lá, até mesmo por causa da agricultura, mas a nossa estimativa não tem como pegar isso”, completa Fernanda Estelita.
De olho nos recursos
Mas o movimento de Ferreiros não é só para recuperar a população e território perdidos, mas também para não perder recursos federais. A maior parte da verba da União enviada aos municípios chega pelo Fundo de Participação dos Municípios (FPM), transferência de verbas prevista na Constituição e composta por recursos do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
O bolo do FPM é calculado anualmente pelo Tribunal de Contas da União (TCU) com base na estimativa populacional dos municípios e na renda per capita de cada unidade da federação. O cálculo considera também se o município está na capital ou no interior. “A ideia é que mais recursos sejam, proporcionalmente, destinados aos municípios com menor capacidade de arrecadação de tributos. Isso faz com que os municípios de menor porte demográfico, algumas vezes, recebam mais recursos per capita do que aqueles de maior porte”, explica o economista, geógrafo e gestor do Observatório de Informações Municipais, François Bremaeker.
Mais cidades na briga
Ferreiros não é a única cidade a brigar com o IBGE. Além dos ferreirenses, outros 18 municípios têm algum tipo de processo na Justiça alegando ter população diversa da estimada pelo instituto. Onze deles ficam no Amazonas e quatro na Bahia. Os estados de Rondônia, Pará e Maranhão têm uma cidade cada na lista. Há ainda municípios que questionam os dados do IBGE, mas que desistiram de uma disputa judicial, segundo a Associação Municipalista de Pernambuco (Amupe).
“Ir à Justiça demora muito. As prefeituras têm que ter argumentos muito consistentes. Porque é preciso provar que o IBGE errou no censo lá atrás (o último foi em 2010). É preciso pegar os formulários que foram aplicados no censo e anular um por um para provar que eles estão errados. Então, não é fácil. Esta é a única tese que o IBGE e a Justiça aceitam, que é quando você desmancha o censo”, diz o presidente da Amupe, José Patriota, afirmando que tentou fazer isso quando foi prefeito de Afogados da Ingazeira, no Sertão de Pernambuco, mas também desistiu.
Por isso, segundo Patriota, as prefeituras têm pedido a urgência da realização do novo censo. “Uma das maiores reivindicações nossas é a realização do censo. Queremos que isso seja atualizado logo, até mesmo para o planejamento de políticas públicas. Tudo que temos são dados chutados. Essa falta de censo atrapalha o Brasil, o Nordeste, os Estados e os municípios”, conclui o presidente da Amupe, afirmando que a estimativa é um dado frio, que não contribui muito com os entes federados. (Por PE Notícias)