Os ministros do governo federal oscilaram nesta segunda-feira (20) na reação à vitória de Javier Milei, e o presidente Lula (PT) deve aguardar as primeiras medidas a serem anunciadas pelo novo líder argentino para definir a estratégia que adotará em relação à nação vizinha.
O convite do presidente eleito da Argentina para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ir a sua posse em dezembro foi visto como um sinal negativo para o futuro da relação.
Integrantes do Palácio do Planalto, no entanto, ainda acreditam que Milei pode adotar postura mais pragmática após assumir o poder e manter boa relação com o Brasil por se tratar de um parceiro comercial estratégico. Além disso, apostam que ele será obrigado a moderar sua postura para conseguir fazer valer suas vontades no Legislativo argentino, no qual não tem apoio da maioria.
Enquanto Lula aguarda os desdobramentos da mudança de comando na Argentina, ele deve escalar seus ministros para fazer o embate político e não dar ares institucionais para críticas a Milei.
Nesta segunda-feira (20), ministros do governo adotaram tons distintos para tratar do tema. O ministro da Secretaria de Comunicação, Paulo Pimenta, disse que Milei, que chamou Lula de “corrupto”, deveria ligar ao presidente brasileiro para pedir desculpas.
“Eu [se fosse o presidente Lula] não ligaria [para parabenizar Milei]. Só depois que ele me ligasse para me pedir desculpa. Ofendeu de forma gratuita o presidente Lula, cabe a ele um gesto como presidente eleito, de ligar para se desculpar. Depois que acontecesse isso, eu pensaria na possibilidade de conversar”, afirmou o ministro.
O titular da Fazenda, Fernando Haddad, por sua vez, evitou comentar o resultado eleitoral do país vizinho. Ele, que já chegou a dizer que a vitória de Milei “preocupava”, afirmou que, agora, é melhor “aguardar”.
“O presidente Lula demonstrou apreço pela democracia, [disse] que o nosso continente tem que fortalecer a democracia. Tem que aguardar os acontecimentos, agora não há muito o que comentar”, declarou.
O chefe da equipe econômica fez referência à publicação do mandatário nas redes sociais. No texto, ele não mencionou nominalmente o vitorioso, mas desejou sorte à nova gestão e enalteceu a democracia argentina.
Caso Milei mantenha o tom da campanha, interlocutores no Planalto têm avisado nos bastidores que o governo não vai baixar a guarda para as ameaças vindas do novo ocupante da Casa Rosada. Não haverá, por exemplo, iniciativas de conciliação com a equipe de Milei.
O governo espera sinalizações do lado do novo presidente argentino, nem que sejam por intermediários, como ministros indicados da nova gestão ou membros do corpo diplomático.
Entretanto, há a expectativa no Executivo federal de que os primeiros dias após a eleição sejam marcados por um reforço da retórica, em particular contra o Mercosul e com pautas negacionistas. Por isso, o Planalto pretende adotar uma estratégia dupla com Milei. As relações entre os países serão mantidas em bom nível pelas vias diplomáticas, através do Ministério das Relações Exteriores.
Por outro lado, ministros do governo Lula eventualmente podem ser escalados para iniciativas retóricas direcionadas ao novo presidente argentino. A estratégia prevê inicialmente que as críticas fiquem a cargo desses ministros palacianos ou mais ligados ao PT, como Paulo Pimenta. No entanto, como alerta um integrante do governo, Lula também é um político de personalidade forte e pode eventualmente assumir para si a iniciativa de rebater o argentino.
Uma das primeiras preocupações do governo brasileiro será com a articulação da América do Sul em relação às questões climáticas. Membros do governo brasileiro consideram que a COP (Conferência das Partes, encontro anual das Nações Unidas voltado às mudanças climáticas), que será realizada em Dubai, ainda não deve refletir as posições negacionistas de Milei, uma vez que vai acontecer antes da posse.
“Certamente não vai dar tempo para eles saírem da COP nesse evento”, afirma Ana Toni, secretária Nacional de Mudança de Clima, do Ministério do Meio Ambiente, durante briefing com jornalistas no Palácio do Itamaraty.
O secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, André Corrêa do Lago, afirmou esperar que a sociedade argentina promova um debate interno, deixando clara a importância de ações contra a mudança do clima. Milei já afirmou que os homens não são responsáveis pelo aquecimento global e disse essa discussão está afetada pelo “marxismo cultural”.
“Vamos aguardar [as posições do novo governo argentino], mas eu acredito que a resposta a isso definitivamente é a ciência. Então espero que também haja dentro da Argentina, como há dentro dos Estados Unidos, um movimento muito grande daqueles que realmente conhecem a mudança do clima”, afirmou o embaixador.
“Como nós sabemos, a Argentina tem um número extraordinário de cientistas e acadêmicos. Vamos ver se eles têm um debate interno sobre esse tema que leve a um posicionamento construtivo com relação à negociação”, completou.
Fonte: FOLHAPRESS
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