MARCbot foi criado para operações militares dos EUA no Iraque e no Afeganistão pela empresa Exponent. (Foto: Reprodução/BomDiaBrasil)
“Não vimos outra opção”, afirmou Mark Brown, chefe da polícia de Dallas, no Texas, ao confirmar que o franco-atirador que matou cinco policiais na quinta-feira passada havia sido morto com auxílio de um veículo-robô movimentado por controle remoto.
Os agentes usaram um Robô Multifunção Ágil de Controle Remoto, conhecido como MARCbot, levando um explosivo, para eliminar Micah Johnson, o jovem de 25 anos que havia se refugiado em um edifício-garagem de Dallas após disparar contra a polícia.
O tiroteio começou por volta das 20h45 (hora local) da quinta-feira, no local em que ocorria um protesto pela morte de Alton Sterling e Philando Castile, dois homens negros mortos por policiais brancos em Minnesota e Louisiana.
Segundo o chefe de polícia de Dallas, antes de morrer, Johnson disse que sua intenção era “matar brancos, principalmente agentes brancos” após as mortes de Sterling e Castile.
O Exército dos EUA já usa o MARCbot no Iraque e no Afeganistão há mais de uma década. Mas seu uso no episódio de Dallas levantou questões sobre a crescente militarização da polícia e as consequências do uso de equipamento de guerra em centros urbanos.
Policiais se protegem após tiros serem disparados durante uma manifestação contra a violência policial contra negros, no centro de Dallas, no Texas, nos Estados Unidos. Um homem abriu fogo contra a polícia, matando 5 e ferindo outros sete (Foto: Smiley N. Pool/The Dallas Morning News/Reuters)
O robô é do tamanho de um cortador de grama, tem quatro rodas ou esteiras unidas por um chassi que suporta uma bateria de seis horas de duração, uma câmera giroscópica, um alto-falante, microfone e um braço mecânico.
Os operadores operam o dispositivo de forma remota com um controle e uma tela.
Podem enviá-lo a locais perigosos para que sejam “vistos” e examinados com sua câmera, usar seu braço para mover objetos suspeitos, ativar cargas explosivas ou interagir com alguém por meio do alto-falante e do microfone.
“Não vimos outra opção a não ser usar o robô com uma bomba e colocar o explosivo em sua extensão para detornar onde o suspeito estava”, disse Brown.
“Outras opções teriam exposto nossos oficiais a um grande perigo. O suspeito está morto como resultado da detonação”, acrescentou.
MARCbot no front
A empresa que fabrica o MARCbot, Exponent Inc., explica que se trata de um veículo “barato e de missão específica desenvolvido para inspecionar dispositivos caseiros explosivos ou material suspeito”.
Foi projetado em 2002 a pedido do Exército americano, que queria evitar mais baixas de soldados enviados a missões em que eram expostos a objetos suspeitos ou locais inseguros.
A empresa fabricou mais de mil MARCbot para uso nas guerras do Iraque e do Afeganistão, segundo a Exponent.
Mas esses robôs não tinham sido muito usados para matar inimigos, segundo Tom Gorup, um veterano de infantaria do Iraque e Afeganistão, à agência de notícias AP.
“São bem lerdos e são empregados para (tarefas de) reconhecimento em local de ofensivas”, explicou.
No caso de Dallas, a polícia ainda não detalhou como o MARCbot se aproximou suficientemente do suspeito para que a explosão causasse sua morte.
A BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, tentou obter mais informações sobre isso com as autoridades de Dallas, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
Primeiro caso letal
O especialista em segurança Peter W. Singer, membro do centro de estudos New America Foundation, com sede em Washington D.C., afirma que é “a primeira vez que o robô é usado desta forma pela polícia”.
Quando Singer escreveu seu livro Wired for War, em 2009, ouviu de um soldado americano que robôs deste tipo foram usados algumas vezes contra insurgentes no Iraque, segundo a agência de notícias AP.
A própria polícia de Dallas já havia usado um MARCbot antes, em junho de 2015, para uma detonação controlada de um pacote na qual ninguém ficou ferido.
Micah Johnson (Foto: reprodução GloboNews)
Nesta ocasião, um homem que abrira fogo com um rifle de assalto contra uma delegacia “havia colocado um dispositivo explosivo” em um estacionamento junto à sede da polícia.
“O dispositivo foi detonado por membros do Esquadrão de Bombas que usaram um robô em uma operação de segurança”, segundo autoridades.
O Centro de Estudos dos Veículos Não Tripulados, com sede em Washington D.C., criou um mapa no qual identificou 201 entidades locais, estatais e federais nos EUA, que têm veículos MARCbot e de outros modelos semelhantes para suas operações.
Além de Dallas, outras cidades dos EUA com este tipo de tecnologia são Washington D.C., San Francisco, Los Angeles, Miami, Oklahoma, Houston, assim como o FBI e o Departamento de Justiça.
“Esses robôs são uma presença crescente nos departamentos de polícia em todo o país, devido em boa medida a um programa do Departamento de Defesa que transfere o excesso de material militar para a polícia americana”, disse o relatório do Centro de Estudos dos Veículos Não Tripulados.
Salvar ou acabar com vidas
Estes veículos de controle remoto podem ter outros usos.
A polícia de San José, na Califórnia, usou um robô semelhante em 2015 na negociação com um homem que ameaçava pular de uma rampa em uma estrada.
Por meio do robô, a polícia entregou a ele um telefone para as negociações, e também comida.
Mas a morte de Micah Johnson em Dallas colocou em discussão o uso para matar de um dispositivo pensado para salvar vidas, como disse à AP William Cohen, ex-funcionário da Exponent Inc. que projetou o MARCbot.
“Onde a polícia colocará o limite quando estiver tentando decidir entre continuar negociando e fazer algo assim?”.
(Da BBC)